Ferramenta (subutilizada) para a educação

terça-feira, setembro 22, 2009

JORNALISMO CIENTÍFICO

Ferramenta (subutilizada) para a educação

Por Júlio Ottoboni em 22/9/2009


Os novos contornos informativos surgidos nos últimos anos com o torrencial noticiário sobre as mudanças climáticas globais abriram espaço para uma nova modalidade de jornalismo científico – o que explora o cunho educativo. Alguns veículos de comunicação já testam timidamente essa nova tendência, escapando do catastrofismo ou do sensacionalismo amparado pelo resultado de pesquisas e suas projeções. Mas há algo que o jornalismo generalista, que roga a todo momento por mudanças, precisa entender: não há como informar com qualidade sem educar para isto.

O lastro cultural para se compreender, principalmente, as informações provenientes do segmento científico e tecnológico – tal sua diversidade e convergência de temas – necessita de uma razoável formação na área. Entretanto, isto é difícil de ser encontrado tanto nas redações dos jornais como no público consumidor de notícias em geral.

Um desafio que necessita de esforços múltiplos para ser superado, embora ainda caminhemos em descompasso com a própria produção científica e com a premência de se compreender o que acontece de alterações no planeta e ainda poder distinguir o que são meras especulações e teorias forjadas na ânsia de ter seus minutos de projeção na mídia.

As próprias relações entre cientistas e jornalistas precisam passar por uma reciclagem e estabelecer um comportamento compromissado no esclarecimento da opinião pública. Por sua vez, o pesquisador será impelido ao didatismo, sob a ótica da importância da informação a ser prestada. Do outro lado, o jornalista terá por obrigação profissional buscar conhecer melhor os assuntos a serem abordados.

Ciência e questões climáticas

Ambos serão os novos atores deste cenário social, mas para isto precisam ter a humildade necessária para sanar todas as dúvidas recorrentes desse processo, por mais primárias que sejam, antes de veicular a informação. Pois a intenção é que grande parte do material gerado nesta combinação seja utilizado em sala de aula em todos os níveis de formação, se possível.

Num primeiro instante, isto parece óbvio, contudo ainda estamos longe desta relação ser norteada por essas premissas. Logicamente, é impossível para qualquer uma das partes deter o conhecimento de todos os estudos, pesquisas e informações que transitam no mundo científico. Mesmo que neste universo imenso apenas uma ínfima parte venha a ser conhecida do público, o jornalismo precisa resgatar sua função de formador de massa crítica, que transcende os limites convencionais e se transforma numa ferramenta para educar.

Mas os jornais pecam por ter uma visão extremamente conservadora das questões que envolvam a ciência. Começa pelo absurdo de separar em editorias diferentes temas relativos às ciências e meio ambiente, como se fossem assuntos sem a mesma origem. Para piorar, agora ainda surge uma tendência editorial de apartar da ciência as questões climáticas. Isto não facilita em nada para o leitor, só complica o entendimento sobre a interação entre as áreas de estudo.

Um novo papel social

Outro descalabro é criar cadernos ou suplementos de educação cuja função é só informar sobre o ensino formal e debater pontos apenas voltados a essa visão. Todavia, são nulos em termos de reportagens que tenham um foco didático sobre temas de relevância para a compreensão do momento da sociedade, das políticas econômicas e ambientais. Ou mesmo apenas para aumentar o conhecimento do público leitor e agregar outros valores ao conteúdo informativo. Tratam educação como algo estagnado nas salas de aulas e cursos formais.

Até certo ponto, isso é constrangedor pois prova que o jornalismo se compreende distante do contexto educativo, como se pudesse separar sua faceta formativa da informativa. Para corroborar a situação, muito cômoda por sinal, também se negligencia a produção de conteúdos mais aprofundados, muito disso por falta de qualificação de seus profissionais.

Uma das conseqüências desse processo é a falta de estímulo para se criar um segmento de leitores mais preparados para avaliar e tomar decisões. Agora, cabe à imprensa, como instituição, saber se pretende encarar esse novo papel social. Pois um público leitor mais intelectualizado e preparado cobrará, inclusive, o próprio produto oferecido pelos jornais.