O editorial da Folha de São Paulo sobre a manutenção do naturalismo filosófico

quarta-feira, dezembro 17, 2008

Agentes do Design Inteligente infiltrados na redação da Folha de São Paulo obtiveram o seguinte rascunho de editorial que, devido às forças ocultas da Nomenklatura científica, foi simplesmente descartado de ser publicado na edição de 16/12/2008.
Imagem de Elizabeth Glassanos.

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A manutenção do naturalismo filosófico

[Só para assinantes da FSP ou do UOL]

No Brasil como em outros países, observa-se uma crescente pressão das comunidades científicas para aumentar a influência isolada da Nomenklatura científica (influenciada pelo naturalismo filosófico) sobre o ensino. A face mais visível da investida está na reivindicação de que a mal e nunca bem definida “teoria” evolucionista seja ministrada nas salas de aulas de ciência sem a apresentação das críticas às suas insuficiências teóricas fundamentais no contexto de justificação teórica amplamente conhecidas e discutidas por aquelas comunidades científicas.

Sob o argumento de que Charles Darwin (1809-1882) já explicou tudo sobre o mundo natural e por isso sua teoria teria comprovação definitiva, defende-se com unhas e dentes o ensino da abordagem “somente Darwin”: o acaso e a necessidade, as mutações filtradas pela seleção natural ao longo do tempo (bilhões e milhões de anos) teriam dado origem ao mundo com todas as diversidades e complexidades de espécies conhecidas.

Há muitos conjuntos de proposições sobre a natureza que não encontram tanta corroboração em fatos quanto a teoria da evolução: o registro fóssil, a hipótese da ancestralidade comum, a Árvore da Vida (parece mais um gramado), não sabermos o que é uma espécie, e etc. Sua versão conhecida como Síntese Moderna agregou as descobertas da genética à matriz do pensamento darwiniano e, apesar de ser uma teoria com muitas anomalias não respondidas nos seus estertores no contexto de justificação teórica, e com uma nova teoria da evolução a caminho (não selecionista), mesmo assim afirmam que ela se encontra na raiz do enorme desenvolvimento das ciências biológicas durante o século 20.

Ao evolucionismo, por ser uma teoria de longo alcance histórico falta apoio empírico minimamente comparável: como replicar a hipótese da ancestralidade comum? Como um Australopithecus se transformou em antropólogo? Apesar disso, todos os estabelecimentos brasileiros com orientação secular ensinam a evolução materialista até em aulas de religião. A justificativa esdrúxula está numa noção de visão única que não tem cabimento no ensino de ciências em pleno século XXI.

Antes, a obrigação do professor dessas disciplinas é apresentar aos seus alunos o conhecimento mais atual e seguro, com apoio em observações e medições, mas não é isso que vemos ocorrer nas salas de aulas de ciências e nem nas abordagens desses conhecimentos nos livros-texto de ciências aprovados e recomendados pelo MEC/SEMTEC/PNLEM. Alguns deles ainda apresentam as fraudes das mariposas de Manchester e o desenho dos embriões de vertebrados como “provas” do fato da evolução.

É um equívoco inadmissível atribuir status de Theoria perennis a uma teoria do século XIX, revista e atualizada no século XX (Síntese Moderna), mas que vai ser substituída brevemente pela Síntese Evolutiva Ampliada.

De um lado, a afirmação vazia, mas retumbante, de uma teoria aperfeiçoada e corroborada ao longo de 150 anos de estudos como se fosse Theoria perennis; de outro, uma narrativa ideológica apoiada sobre a autoridade de um consenso que não pode ser recusado pela maioria dos cientistas, pois a Nomenklatura científica é antropofágica e destruidora de carreiras acadêmicas. Para onde foi o espírito crítico em ciência? E a liberdade acadêmica?

O equívoco maior, contudo, é restringir o ensino do evolucionismo nas aulas de ciência, impedindo que seja também ministrado em aulas de religião. Essa atitude solapa, na formação das crianças, o entendimento dos fundamentos do método científico, e das proposições da LDB 9394/96 visando o aprimoramento do educando como pessoa humana, sua formação ética e o desenvolvimento da sua autonomia intelectual e do pensamento crítico, e que as teorias científicas são meros construtos humanos da descrição da realidade passíveis de revisão e até de substituição.

Apontar a incongruência entre evolucionismo (como naturalismo filosófico) como se fosse ciência, no entanto, é o máximo que o poder público tem a fazer nesses casos. Se a opção dos pais, consciente, recair sobre uma escola secular privada que ministre o evolucionismo como Theoria perennis nas aulas de ciência, mas não em aulas de religião, essa é uma esfera de decisão imune à intervenção do Estado.